
Com
a presença da ministra da Secretaria de Política para Mulheres,
Eleonora Menicucci, a Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira, 3,
o projeto que define feminicídio como circunstância qualificadora de
homicídio.
Dessa forma, o assassinato de mulher por condição de sexo passa a
entrar na lista de crimes hediondos. Hoje, estima-se que ocorram mais de
dez feminicídios por dia no País. O projeto vai para sanção
presidencial.
De acordo com o texto, considera-se razão de gênero quando o crime
envolver violência doméstica e familiar e menosprezo ou discriminação à
condição da mulher. A punição para homicídio qualificado é de reclusão
de 12 a 30 anos. Enquanto isso, a pena para homicídio simples é de 6 a
20 anos.
O projeto ainda prevê aumento de pena para casos de feminicídio em um
terço até a metade se o crime for praticado durante a gravidez ou nos
três meses anteriores ao parto; contra menores de 14 anos, maiores de 60
ou vítimas com deficiência; e na presença de pais ou filhos.
A condenação por crime hediondo também prevê o cumprimento da pena
inicialmente em regime fechado e a progressão do regime só poderá
acontecer após o cumprimento de dois quintos da pena, se o condenado for
primário.
No plenário, a ex-ministra da Secretaria de Direitos Humanos, a
deputada Maria do Rosário (PT-RS), comemorou a proposta. "Vai penalizar
mortes de mulheres em decorrência da violência, dos maus-tratos." No
entanto, a medida amplamente defendida pela bancada feminista não teve
consenso. "É precedente perigoso tratar as pessoas de maneira diferente.
Podemos até concordar com a pena maior para morte de grávida, mas não
entre homem e mulher", afirmou o deputado Evandro Gussi (PV-SP) à
Agência Câmara.
O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estima que entre 2001
e 2011 aconteceram mais de 50 mil feminicídios no Brasil - cerca de 5
mil mortes por ano. O aumento de 2,3 para 4 6 assassinatos por 100 mil
mulheres entre 1980 e 2010 colocou o Brasil na sétima posição mundial de
assassinatos de mulheres, conforme justificativa para o projeto feita
pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Violência contra a
Mulher (CPMI).
Em dezembro, o Senado havia aprovado o mesmo texto. À época, a relatora
do projeto, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), classificou a aprovação
do texto como uma resposta às declarações do deputado Jair Bolsonaro
(PP-RJ), que havia afirmado que não estupraria a deputada Maria do
Rosário (PT-RS) porque "ela não merece".
Repercussão
Para Marta Machado, professora da Escola de Direito de São Paulo da
Fundação Getúlio Vargas e pesquisadora do Núcleo Direito e Democracia do
Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, os números indicam a
importância de diferenciar esse crime. "Chama muito a atenção, por
exemplo, o nível de violência usado nesses crimes contra mulheres. É
extremo, muito maior: tortura, desfiguração, 20 facadas. É um fenômeno
diferente."
Ela espera que a ampliação das punições também reflita em áreas como o
Tribunal do Júri. "O caso vai a júri e a gente tem ainda menos controle
do que forma a decisão de um jurado. Os argumentos tradicionalmente
machistas estão muito vinculados", reclama.
Já a professora de Direito Penal e doutoranda em Direitos Humanos na
USP Maíra Zapater discorda da eficácia. "O problema é que usar lei penal
para assegurar direitos humanos da vítima não é a solução. O direito
penal não tem caráter preventivo. A lei vai ser comemorada pelas
mulheres, mas dificilmente vai reduzir o número de mulheres mortas",
afirmou.
Para Maíra, que pesquisa violência contra a mulher, a lei ainda exige a
preparação dos profissionais da Justiça para tratar de questões de
gênero. "O juiz, por exemplo, vai precisar saber o que é discriminação
de gênero." Para a pesquisadora, a violência deve ser combatida com
políticas educativas e sociais.
Fonte: jornal O Estado de S. Paulo.
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